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O Instituto Butantã, órgão vinculado à
Secretaria de Saúde de São Paulo, desenvolveu uma nova substância a partir do
veneno de cobra cascavel, com um poder analgésico 600 vezes maior que o
da morfina. A vantagem da nova droga é que ela não causa
dependência física como a morfina, já que age em receptores
diferentes, e será mais eficaz que os analgésicos hoje existentes para dores
crônicas como as do câncer.
A ideia nascida com o fundador do
instituto e pioneiro no estudo de serpentes no Brasil, Vital Brazil, somente
agora pode ser colocada em prática, quando se conseguiu isolar as moléculas do
veneno responsável pela analgesia. O próximo passo é a realização de testes clínicos,
com apoio da Fapesp e do Consórcio Farmacêutico (Coinfar).
“A descoberta desta nova substância,
extremamente potente e sem poder de dependência, podemodificar, de maneira
única a utilização de analgésicos em pacientes”, afirma o diretor do instituto
Butantã, Otávio Mercadante. A proteína
do veneno da cascavel, a Enpak, responsável pelo formigamento e adormecimento
do local da picada, só foi caracterizada, isolada e sintetizada 70 anos depois
de ter sido usada empiricamente por Vital Brazil para aliviar as dores de
pacientes com câncer.
Segundo a pesquisadora Yara Cury, do
Laboratório de Fisiopatologia do Butantã, que coordena os estudos sobre a nova
substância, o primeiro efeito da picada de uma cascavel é uma sensação de
formigamento, seguida de adormecimento local. “Então a pergunta óbvia é: seria
efeito de um componente analgésico do veneno?’, questiona a pesquisadora.
‘Procuramos registros e documentos sobre o assunto em arquivos e gavetas do
instituto e descobrimos que Vital Brazil diluía o veneno e o enviava para o
exterior’, contou Cury. Os médicos conhecidos de Vital Brazil utilizavam o
remédio em pacientes com câncer e depois enviavam relatos que indicavam que o
veneno (soluto) era muito eficiente no alívio da dor. Não havia menção à
reações adversas.
Os documentos sobre o assunto remontam
à década de 30 quando não havia estudos experimentais como os de hoje, daí a
falta de informações mais detalhadas sobre o tratamento. ‘O que se sabia, conta
Yara, é que o veneno da nossa cascavel, diferentemente de outras espécies de
cascaveis, como as norte-americanas, é neurotóxico, mais parecido com o das
najas indianas. Depois do soluto crotálico, desenvolvido pelo instituto, o
Butantã passou a produzir o que eles chamam de ‘anaveneno’, tratado com formol,
que era usado para aliviar dores reumáticas e nevralgias. Os produtos foram
descontinuados na medida em que as normas de fabricação de medicamentos se
tornaram mais rígidas para preservar a segurança dos tratamentos.
A partir daí a equipe da Dra. Cury começou
as pesquisas em 1991 e conseguiu caracterização farmacológica da substância
analgésica contida no veneno da cascavel. A grande surpresa é que ela revelou,
em uma única dose, um poder de analgesia 600 vezes maior que o da morfina,
resultado que se prolonga por até cinco dias, sem efeitos colaterais. Agora o
medicamento entra em testes pré-clínicos, que vão determinar sua introdução no
mercado.